Segundo período de Arquitetura e Urbanismo - Unileste 2011

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

Anna Letícia Fonseca

JAZIRA E ÁIDA

SOBRE ESTAR ACORRENTADO
É dividir necessidades, querer e não poder, ter a paciência de esperar, conceder, exigir. É ter senso para definir importâncias, criar prioridades. É aceitar que não está só, que devem haver planos, negociações, consentimentos, acordos. É saber pedir ajuda, estar em harmonia, até mesmo sincronia. É compartilhar intimidades, perder a vergonha e ainda assim ser discreto. É ser parte do outro, literalmente.
E torna-se sofrida essa comunhão exagerada, sem tempo para individualismos, sem lugar para egoístas.

MUNDO PSICOLÓGICO
Apesar de se amarem, Jazira e Áida não desejavam ser assim.
Jazira aceitou, compreendeu suas limitações e lida com elas de forma honrosa. Seu espírito inabalável e extrovertido conquistou vários amigos. Foi seu otimismo e alegria que fizeram com que seus defeitos não se sobressaíssem, para que pudesse levar uma vida comum. Conhecer seus defeitos e mesmo assim ser querido por tantos enaltece qualquer áurea, faz brotar mil sorrisos. Sua capacidade de transmitir pensamentos com a irmã as conecta de uma maneira diferente da física. Seus laços passam a ser independentes da ligação vertebral, são metafísicos, virtuais, fraternais. Tornam-se irmãs amigas, cúmplices.
Áida, no entanto, não foi capaz de suportar o peso de estar sempre junto da irmã, ser tão dependente, não poder decidir seu próprio destino. Como se não bastasse, seu tamanho gigante era desproporcional a tudo. Insatisfeita com a situação, tornou-se uma mulher fria, sem muitos gostos, mas muitas habilidades. Seu poder de enxergar objetos distantes fez dela uma observadora, sempre aprendendo. Era desprezada por seu jeito descontente, não tinha amigos e sobre isso não se importava. Seu único amor é sua irmã Jazira, a quem ajuda o tempo todo. Mas sente-se cansada de tanta companhia, queria um mundo particular, para cuidar de si mesma e deixar de sentir-se uma anomalia.

MUNDO DUAL
As atenções, as vezes, merecem ser individualizadas. Assim como os tratamentos, as pessoas e os mundos.
Dois mundos paralelos, separados por uma membrana magnética metafísica, que não corta, que não rompe, que só permite a percepção do mundo em que se está inserido. Mundos habitados por Jazira e Áida, avulsas e ao mesmo tempo perpetuamente ligadas. O afastamento é ilusório e real, continuam coladas pela cervical, mas não notam. Durante o passeio permanecem unidas em pensamento e só, todo o resto não há. Tornam-se dois seres, dois mundos, duas vontades, duas escolhas.
Encontram-se presas pelos ombros nas duas pontas opostas de uma estrutura metálica que desliza numa velocidade constante por um fio invisível. Os destinos são os mesmos, logo se mantém as distâncias e o tempo gasto. No entanto a percepção do tempo se altera, caracterpistica excêntrica do mundo. Cada ponto ou atividade leva os centésimos que se deseja, sem pressa, sem limitações.
O passeio começa, enquanto deslizam os primeiros milímetros elas se comunicam, compartilham expectativas, trocam anseios, se despedem. Jazira encontra amigos apressados que perguntam pelo destino, mas não se sabe a resposta, apesar de percorrer sempre os mesmo lugares, tudo se renova, inclusive as sensações. Os amigos pegam carona no braço descontrolado de Jazira e continuam na viagem. Logo já sente o sol batendo na pele, a brisa fresca e salgada no rosto, os cabelos esvoaçando, o suor. Os pés na areia, levando seu próprio ritmo, os grãos passando entre os dedos. Podia sentir o cheiro das mãos de seu pai barqueiro. Suada e quente, Jazira sente a água gelada batendo nos ombros, levando toda impureza, trazendo frescor, mostrando que a felicidade é espiritual e independe de movimentos.
Enquanto iss, Áida desliza por seu mundo gigante, proporcional ao seu tamanho e passa por um caminho recortado, com uma imensa árvore que conta com seus galhos as histórias que ela nunca pôde ler nos livros. A vegetação mistura cerrado e campos rupestres, passa entre plantas espinhosas com mais de dois metros de altura. Não se preocupa com mais nada, além de seus caprichos e curiosidades. Segundos depois já vê o próximo destino. Para ela não existe suspense, sabe bem o que a espera, enxerga longe. Atravessa uma baía, com grandes peixes, percebe pelas espinhas seus tamanhos. Não sabe definir suas cores, só enxerga preto e branco, mas isso torna a paisagem ainda mais interessante.
Finalmente se encontram, as irmãs, no fim dos mundos. Sem mais barreiras, prontas para sentar, contar suas experiências particulares e enfim repousar. Depois de atravessar um mundo inteiro só, acorrentar-se é doce.

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